Mundo

Bolsonaro cancela viagem aos Estados Unidos, onde receberia homenagem

Presidente atribuiu desistência à 'ideologização da atividade'. Três empresas haviam desistido de patrocinar evento da Câmara de Comércio Brasil-EUA devido a protestos
Foto: ADRIANO MACHADO / REUTERS
Foto: ADRIANO MACHADO / REUTERS

BRASÍLIA e SÃO PAULO — O presidente Jair Bolsonaro cancelou a viagem que faria aos Estados Unidos no próximo dia 12 de maio para ser homenageado em Nova York como a "Personalidade do Ano" pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos. Ele participaria de outros eventos na cidade e em Miami. Em nota divulgada na noite desta sexta-feira pelo Planalto, o presidente agradeceu a homenagem da Câmara de Comércio, mas admitiu que o cancelamento da viagem ocorreu após a premiação ter gerado protestos de diversos grupos nos EUA. O prefeito de Nova York, o democrata Bill de Blasio, chegou a chamar Bolsonaro de  “ser humano perigoso”.

“Em face da resistência e dos ataques deliberados do prefeito de Nova York e da pressão de grupos de interesses sobre as instituições que organizam, patrocinam e acolhem em suas instalações o evento anualmente, ficou caracterizada a ideologização da atividade”, informou o texto divulgado pelo gabinete do porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros.

A viagem foi cercada de controvérsias. Nas últimas horas, um abaixo-assinado contra a ida do presidente brasileiro à cidade obteve, em poucas horas, mais de 58 mil assinaturas, sob a alegação de que Bolsonaro é uma ameaça ao meio ambiente, aos direitos LGBTI e às minorias. Da mesma forma, ativistas estão, desde o dia 30 de abril, protestando diariamente na porta do hotel Marriott Marquis, que receberia a premiação, que estava prevista para 14 de maio. O abaixo-assinado foi lançado pelo senador estadual democrata de Nova York Brad Hoylman, que representa, entre outras áreas de Manhattan, Times Square, onde está localizado o hotel.

No último dia 30, pelo menos três empresas que figuravam entre as patrocinadoras do evento na Câmara retiraram seus apoios: a companhia aérea Delta, a consultoria Bain & Company e o jornal Financial Times. A Folha de S. Paulo ainda revelou que, pela primeira vez o Banco do Brasil apoiava o evento — colocando dinheiro estatal no jantar de gala. Além disso, o Consulado-Geral do Brasil em Nova York confirmou ao GLOBO ter adquirido uma mesa de dez lugares no evento ao custo de US$ 10 mil.

“Essa mesa é tradicionalmente adquirida pelo Consulado-Geral nas edições anuais da cerimônia de entrega do título de Personalidade do Ano. O custo é normalmente previsto na programação orçamentária anual do setor de promoção comercial do Consulado-Geral”, relatou o Itamaraty, acrescentando que “a mesa é normalmente ocupada por convidados institucionais”, como diplomatas, acadêmicos e empresários.

A Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos foi criada para facilitar negócios entre os dois países.  A escolha de Bolsonaro como Personalidade do Ano gerou constrangimentos dentro da própria entidade, incluindo pelo fato de o brasileiro ser o primeiro presidente em exercício a receber a honraria.

Um grupo de empresários avaliou que a escolha do novo presidente não se justificaria, devido ao pouco tempo de mandato, e por suas posições ideológicas, que seriam, no seu entender, contrária a temas caros aos americanos que fazem parte da organização, como a tolerância e o multilateralismo.

No ano passado, o ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sergio Moro, foi o agraciado pela Câmara de Comércio. Na agenda, ainda estava previsto um evento organizado por empresários brasileiros, juntamente com o ministro da Economia, Paulo Guedes, os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, e o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, além do secretário da Fazenda de São Paulo, o ex-ministro Henrique Meirelles. Bolsonaro ainda viajaria a Miami para um encontro com parlamentares americanos.

A emissora americana CNBC afirmou que a decisão das três empresas de deixarem de patrocinar o evento ocorreu após a pressão de ativistas da comunidade LGBTI , que criticam as políticas, posições e declarações do presidente brasileiro contra o meio ambiente, gays, negros, indígenas e direitos humanos.

Inicialmente, o tradicional jantar de gala seria no Museu Americano de História Natural , mas a instituição desistiu da ideia após uma série de protestos de membros da comunidade científica, que classificaram Bolsonaro como um “inimigo” da preservação ambiental. Em seguida, o restaurante Cipriani Hall, em Wall Street, também se recusou a sediar o jantar diante da pressão de críticos do presidente, entre eles o prefeito de Nova York, Bill de Blasio. Ele foi transferido, então, para o hotel Marriott Marquis. Bolsonaro, por sua vez, disse que receberia a homenagem “até na praia”.

Em nota, a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, afirmou que o evento será realizado, mesmo sem a presença de Bolsonaro.

“A Câmara de Comércio Brasileiro-Americana tomou conhecimento, através do escritório do Presidente da República do Brasil, que o Presidente Jair Bolsonaro, recipiente do pêmio de Personalidade do Ano de 2019, não comparecerá ao Jantar de Gala no dia 14 de maio. A Câmara afirma que o Jantar de Gala será realizado conforme o programado, incluindo a apresentação do Programa de Bolsas de Estudo Personalidade do Ano de 2019, e prêmios reconhecendo importantes colaboradores para a Responsabilidade Social e Inovação Digital. Outros eventos paralelos programados durante a semana serão realizados conforme o planejado. A Câmara fornecerá mais atualizações assim que estiverem disponíveis”, diz o comunicado.