Mater Ter Admirabilis
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Dom Antônio de Castro Mayer – O Leão de Campos +25/4/1991

Dom Antônio de Castro Mayer, bispo de Campos dos Goytacazes (estado do Rio de Janeiro, Brasil) partia à casa do Pai no dia 25 de abril de 1991, há 30 anos atrás. Mas quem foi ele, e por que razão particular celebrar a sua memória?

Órfão aos 6 anos de idade

Nascido em 1904 na cidade de Campinas (estado de São Paulo), filho de um imigrante alemão e de uma brasileira, teve uma infância muito pobre. Órfão de pai aos 6 anos de idade, ele e seus onze irmãos herdaram somente um bem valioso: a Fé Católica. Duas de suas irmãs tornaram-se freiras e Antônio entrou para o seminário aos 12 anos de idade. Aluno destacado, foi enviado a Roma, à Universidade Gregoriana, onde concluiu seus estudos. Foi ordenado sacerdote pelo Cardeal Basilio Pompilj em 1927, e no ano seguinte recebeu o título de Doutor em Teologia pela mesma universidade. Retornando ao Brasil, foi professor no seminário arquidiocesano de São Paulo durante 13 anos. Em 1940 foi nomeado cônego e tesoureiro da Catedral Metropolitana da Sé em São Paulo e, no ano seguinte, tornou-se vigário-geral da Arquidiocese de São Paulo.

Com a morte do Arcebispo de São Paulo, D. José Gaspar D’Afonseca e Silva, em um acidente de avião no Rio de Janeiro em 1943, assume a arquidiocese, no ano seguinte, Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta. Logo em seguida Dom Antônio é removido de seu cargo e nomeado pároco da igreja S. José do Belém, em um bairro pobre na periferia de São Paulo. Embora somente possam ser feitas conjecturas sobre o evidente rebaixamento de D. Antônio com a chegada de Carlos Carmelo, sabe-se que este é da linhagem episcopal do influente cardeal Rampolla, do qual suspeita-se seja a origem da infiltração maçônica na Igreja. Carlos Carmelo também foi o fundador da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que se tornará, nas décadas seguintes, uma enorme inimiga de D. Antônio e tem se revelado hoje como o agente impulsionador do marxismo e do modernismo no Brasil.

Bispo de Campos dos Goytacazes

O ostracismo de D. Antônio de Castro Mayer termina com sua inesperada nomeação, em março de 1948, como bispo coadjutor da diocese de Campos dos Goytacazes, dela tornando-se bispo titular no ano seguinte. A cidade de Campos, a 300 km. do Rio de Janeiro, então com 700 mil habitantes e importante polo petroquímico, nunca foi entretanto uma diocese proeminente. Aí se antevê a influência e o peso do partido modernista dentro da Igreja, procurando isolar todo prelado fiel à doutrina perene da Igreja.

Ele, apesar disso, não se revoltou. Exerceu o episcopado exemplarmente, como pai e pastor. Tinha uma habilidade de mover-se entre seus fiéis e misturar-se com eles na vida cotidiana sem de qualquer maneira diminuir ou desfigurar sua autoridade. Viveu a vida de sua diocese com os fiéis em todos os seus aspectos mais ordinários, e contudo sempre manteve sua dignidade como bispo. Serviria como acólito na Missa de seus jovens padres recém-ordenados. O fazia sem falsa humildade e sem nunca fazê-los se sentir desajeitados. Não havia nada sobre sua própria Missa que a fizesse extraordinária, nada que a distinguisse.

Foto: D. Antônio indo crismar seus fiéis no vilarejo de Paraoquena, en 1980

Um de seus padres o descreveu nestas palavras: “Ele foi um homem de grande simplicidade. Tinha a alma de uma criança”. Nunca falou mal de outros e se recusava a acreditar, às vezes para sua tristeza, que outros pensariam ou falariam mal dele. Amava crianças e aproveitava as ocasiões quando podia estar com elas. Era, em seu tranqüilo modo, uma delas.

Um devoto de Maria

A incessante e intensa devoção de Dom Antônio à Santa Mãe de Deus marcou seu reinado em Campos. Uma de suas primeiras ações ao tornar-se Bispo de Campos dos Goytacazes foi publicar uma ordem especial a seus padres: doravante na diocese, ao fim de toda Missa, três Ave-Marias adicionais seriam rezadas pelo padre e fiéis à Nossa Santa Mãe com a intenção de que ela preservasse a verdadeira Fé Católica e de que a heresia nunca encontrasse abrigo na diocese. Tal devoção foi recompensada.

Foto: D. Antônio em uma cerimônia de coroação de Nossa Senhora

Ele mesmo rezaria o rosário em todas as horas do dia ou da noite. Seus padres relatam que quando viajavam com ele, muitas vezes ele os acordava em horas incomuns para rezar o rosário porque adorava rezar acompanhado. Certa vez durante uma visita ao seminário da Fraternidade São Pio X em Écône, Suiça, o bispo acordou seus companheiros de viagem depois do “apagar das luzes” do seminário, uma hora de silêncio estritamente obrigatório, e anunciou seu desejo de rezar o rosário. Lembraram a ele que era tarde e que o seminário estava observando um período de silêncio e repouso, mas sua devoção a Nossa Senhora não seria dissuadida. Foram com ele assim que começou a andar pelos corredores do seminário com sua voz ecoando as Ave-Marias. As cabeças dos seminaristas enraivecidos começaram a aparecer enquanto mais e mais portas iam se abrindo bruscamente. Ao encontrar o vibrantemente fervoroso Dom Antônio como o réu rezador, suavemente fechavam suas portas e envergonhados retornavam para suas camas.

A tormenta se aproxima

A qualidade final de Dom Antônio de Castro Mayer que definia seu caráter é óbvia – sua grande inteligência. Antevendo a grande crise da Igreja, já infiltrada por tantos religiosos infiéis e suas heresias, nos anos 1950 e 1960 escreveu cartas pastorais atacando o modernismo e o comunismo, o que só lhe rendeu mais inimigos – no Brasil e em Roma. Durante o concílio Vaticano II, ajudou a fundar e dirigir o grupo Coetus Internationalis Patrum, formado por mais de 250 padres conciliares, que tentou evitar que o Magistério e a Tradição da Igreja fossem aniquilados pelo partido modernista durante as deliberações conciliares. O grupo chegou a coletar as assinaturas de mais de 500 padres conciliares pedindo ao Santo Padre uma refutação expressa do comunismo, o que nunca foi atendido.

Na primavera de 1969, a espada feriu desde Roma. O papa Paulo VI decretou que uma nova Missa seria instituída. Isso não era apenas um escândalo; o prefácio à descrição do novus ordo missae dava uma nova definição do Santo Sacrifício da Missa que beirava um impensável desvio à heresia. O imenso Sacrifício da Missa tornara-se uma simples ceia. A mudança na natureza do sacramento pode ser entendida rapidamente ao simples contar o número de referências a “sacrifício” no rito Tridentino e compará-lo ao número de referências na nova Missa. Isso não era só novo; era o esmagamento do antigo ritual do sacrifício e a substituição por uma nova visão.

Dom Castro Mayer não falou uma só palavra, mas chamou seu carro e um motorista, ciente de que não estava em condições de dirigir. Pediu que fosse levado ao seminário diocesano, no extremo norte da diocese, a 150 km. de Campos. Depois da jornada em angustiante silêncio, entrou no seminário, a carta ainda em mãos, e, aparentando palidez, tenso e chocado, a entregou ao Padre José Possidente, diretor do seminário. E então falou pela primeira vez desde que abriu e leu a carta, “Não é possível, não é possível; eu não vou aceitar isso”, e lágrimas marejavam aqueles olhos brilhantes e escapavam abaixo a face pálida pelo choque. Uma grande tristeza tomou conta do bispo e, em algum canto de sua alma, aquela dor, uma dor sentida por todos os fiéis que conheciam e amavam a Missa, nunca passou. Esse jugo não era suave; esse fardo não era leve.

Mas isso não mudaria seu senso do dever. Fora-lhe dada uma tarefa a ser cumprida e ele continuaria a desempenhá-la. A situação agora, de certo modo, se esclarecia. Os modernistas então chegaram a essa extensão em seu furor de demolição, seu carnaval de liberdade, sua orgia de sacrilégio. Os pastores estavam a serviço dos lobos e o rebanho estava cercado. Logo os cadáveres ensangüentados se espalhariam pela paisagem sob um céu vazio desprovido de luz. Dom Castro Mayer não iria consentir a esta selvageria. Ele tinha seu próprio rebanho para guardar. Ele deveria fazer uma sólida guarda e preservar agora não apenas a Fé em sua diocese, mas, Deus o ajude, também a Missa. Armou-se com as armas de um bispo: mitra, báculo e anel, sinais de autoridade dados a ele em sua sagração, e tomou a caneta. Esgotado e entristecido, combateu.

O Leão ruge

Em 1973, Paulo VI lhe ordenou de manifestar livremente o seu parecer, caso em consciência não estivesse de acordo com atos do atual Magistério ordinário da Igreja. Dom Antônio de Castro Mayer escreveu, então, em janeiro de 1974, a seguinte carta a Paulo VI:

[…] “Ao longo dos anos foi tomando corpo em meu espírito a convicção de que atos oficiais de Vossa Santidade não têm, com os dos Pontífices que o antecederam, aquela consonância que com toda a alma eu neles desejava ver.

Não se trata, é claro, de atos garantidos pelo carisma da infalibilidade. Assim, aquela minha convicção em nada abala a minha crença irrestrita e enlevada nas definições do Concílio Vaticano I.

Receando abusar do valioso tempo do Vigário de Cristo, dispenso-me de mais amplas considerações e limito-me a submeter à atenção de Vossa Santidade três estudos:

1. Sobre a
“Octogésima Adveniens”.
2. Sobre a Liberdade Religiosa.
3. Sobre o novo “
Ordo Missae”.

(Esse último de autoria do advogado Arnaldo Vidigal Xavier da Silveira, a cujo conteúdo me associo).

Supérfluo será acrescentar, que neste passo, como já em outros de minha vida, darei cumprimento, em toda a medida preceituada pelas leis da Igreja, ao Sagrado dever da obediência. E neste espírito, com o coração de filho ardoroso e devotíssimo do Papa e da Santa Igreja, acolherei qualquer palavra de Vossa Santidade sobre este material.

De modo especial suplico a Vossa Santidade queira declarar-me:

a. Se encontra algum erro na doutrina exposta nos três estudos anexos;

b. Se vê na atitude assumida nos ditos estudos face aos documentos do Supremo Magistério, algo que destoe do acatamento que a estes devo como bispo. […]


Dom Antônio jamais recebeu uma resposta a esta carta. Mas continuou sendo pastor de suas ovelhas. E celebrando a missa em latim até sua aposentadoria forçada, aos 75 anos de idade, no ano de 1981. Dessa forma, Campos foi a única diocese do mundo onde a missa tradicional em latim continuou sendo celebrada ininterruptamente por todo o seu clero apesar do advento do novus ordo. E, como o pai não se aposenta de sua paternidade, Dom Antônio tampouco abandonou suas ovelhas após ser forçado a aposentar-se: fundou a União Sacerdotal S. João Maria Vianney, onde acolheu a maioria dos sacerdotes de sua diocese (336 deles!) e mais de 40 mil fiéis que perderam suas paróquias quando o lobo que assumiu a diocese decidiu implementar o Vaticano II à força, eliminando tudo que recordasse a Tradição católica.

D. Antônio e D. Lefebvre

A maioria de seus antigos parceiros na defesa da Igreja foi, com o tempo, cedendo, preferindo uma falsa e confortável obediência à defesa da verdade, e dando causa à destruição da fé no outrora maior país católico do mundo, hoje um pasto para pentecostais, agnósticos e supersticiosos.

O único remanescente foi o bispo francês Dom Marcel Lefebvre, com o qual, após repetidas súplicas sem resposta da parte de João Paulo II para que ordenasse bispos respeitosos da tradição, e após o escandaloso encontro ecumênico de Assis em 1986, onde se viu o mesmo infeliz papa beijando o Alcorão e introduzindo no Templo de Deus todo tipo de divindades pagãs, considerando o estado de necessidade da Igreja, ordenaram quatro bispos em Écône, na Suíça, em 1988.

Foto: D. Antônio nas ordenações episcopais em Écône (Suíça), em 1988

Tal estado de necessidade, segundo D. Antônio, explicar-se-ia, entre outras razões, pela nulidade de todas as ordenações sacerdotais e episcopais em que fosse observado o ritual de Paulo VI, que lhe suprimira partes essenciais como a invocação do Espírito Santo, o poder de perdoar os pecados, a ordem de celebrar o sacrifício da missa e, no caso dos bispos, o poder de ordenar sacerdotes. Com isso, haveria o risco de, em uma geração, não haver mais sacerdotes validamente ordenados e, portanto, sacramentos validamente dispensados.

Foto: João Paulo II recebe, no Vaticano, a Comissão Trilateral, grupo da elite maçônica mundial fundado por David Rockefeller

D. Antônio em comunhão com a Igreja de Jesus Cristo ou com uma igreja maçônica?

Os marxistas Boff, Gutiérrez e Sobrino foram excomungados? Os gnósticos Rahner e Zundel, os hereges Kasper, Küng, Schillebeeckx foram excomungados ou ao menos afastados de seus cargos? Com todos estes os papas foram estranhamente “misericordiosos”. Em coerência, claro, com as suas próprias ações: beijar o Alcorão, beijar os pés do bispo cismático de Constantinopla, permitir mulheres com os seios desnudos no altar durante uma missa pontifical, receber bênção de xamãs, apagar a menção da maçonaria entre as sociedades secretas que dão causa à excomunhão, etc.

Foto: João Paulo II beijando o Corão

O que antes parecia um exagero de uma minoria mostra-se cada vez mais real: sacerdotes que não creem em Cristo, igrejas vazias, falta de vocações, conventos fechados. Compare-se essa igreja da “primavera de Vaticano II” com a Igreja da Tradição: igrejas cheias, afluência de vocações, fervor religioso, obediência aos mandamentos, temor a Deus.

O Código de Direito Canônico exige, para a pena de excomunhão, uma manifestação da Sé Apostólica, isto é, do papa, a qual nunca houve. O que ocorreu foi uma declaração de excomunhão de seis bispos por outro bispo, o card. Gantin, em documento onde a assinatura papal nunca constou. Ora, um bispo não possui jurisdição para excomungar outro bispo, sendo competência reservada ao Papa. O motu proprio "Ecclesia Dei adflicta", publicado pelo próprio João Paulo II referente à ordenação dos quatro bispos, omite o nome de D. Antônio de Castro Mayer e menciona que os outros cinco bispos incorreram na pena de excomunhão declarada por Gantin, que não possuía competência legal para fazê-lo, e sem tampouco aclarar a alegação de estado de necessidade. Seria isso uma seqüência de graves equívocos ou erros propositais?

Foto: mulher com os seios nus faz leitura em missa com João PAulo II em Papua (1984)

Isso foi confirmado pelo gesto de Bento XVI, que anulou todas as excomunhões relacionadas às ordenações episcopais de Écône, sem que os envolvidos tenham expressado qualquer retratação ou reconhecimento de haverem agido erroneamente. Por quê? Talvez porque quem errou foi o papa. Talvez porque mesmo João Paulo II fosse forçado a reconhecer a heroicidade desses dois bispos católicos mas, refém de seus amigos modernistas, lhe faltasse essa mesma coragem para fazê-lo.


Fotos: mesmo papa, outra mulher seminua. Dessa vez João Paulo II lhe dá mesmo a comunhão

Foto: o então Card. Wojtyla, em shorts, acampa com algumas moças

Fontes:

O Leão de Campos: Quem Era Este Homem?

Livre «La gueule du lion - Mgr Antonio de Castro Mayer et le Dernier Diocèse Catholique», par Dr David Allen White

Bishop Antonio de Castro Mayer: In Memorium

Was Archbishop Lefebvre Really Excommunicated?